Se você está lendo isso, terminei um projeto que durou alguns meses em minhas mãos: finalmente tenho um novo blog / portfólio feito do zero para os jogos, projetos e textos que adoro fazer como hobby. Sim, é simples, não tem anúncios (e nunca terá), mas fiz dele meu espacinho na web e estou muito feliz com isso.

Mas quando olho para a web ao meu redor, uma coleção antiquada de textos parece meio... estranho? A internet hoje é um mercado que nunca dorme, cujos principais produtos são o tempo de tela e os seus dados de navegação. Vídeos curtos precisam de gameplay do Subway Surfers para que as pessoas possam realmente prestar atenção. Uma pesquisa no Google é andar por um campo minado e você só vai conseguir o que deseja na página 3, o que seria inacreditável alguns anos atrás. E, claro, o pensamento constante de "isso é feito por uma IA que rouba conteúdo?" será perguntado para sempre até o fim dos tempos.

Eu costumava ver pessoas discutindo sobre como esse estágio de capitalismo tardio em que vivemos obriga você a transformar seus hobbies em negócios e trabalho... mas a Web é tão estranha que, às vezes, o engajamento é muito mais valioso que o dinheiro. Ganhar os algoritmos das redes sociais apenas para se conectar às pessoas, mesmo que você não queira lucrar com isso, é obrigatório.

Não me impressiona o quanto espaços fechados estão se tornando a realidade para comunidades em todos os lugares. Se você quiser encontrar um lugar para falar sobre um assunto há alguns anos, provavelmente encontraria um fórum aberto e pesquisável, ou até mesmo um grupo de e-mail. Hoje, o melhor que você pode encontrar é um grupo de Telegram ou um servidor no Discord, que se perderá para sempre assim que essas empresas falirem no futuro.

Não demorei tantos meses para programar um blog simples. Eu realmente fiz isso em um mês, incluindo o tempo pra escrever alguns textos novos. Todo esse tempo foi tentando entender porque estou na internet. Nunca me lembro de uma época na minha história em que não estivesse online, mas o que isso significa para o meu eu adulto? Por que se preocupar em criar um espaço especial para mim no meio do inferno digital? Esse blog é o resultado disso.

Nasceu e já tinha um e-mail

Nasci em agosto de 1998 em uma cidade do extremo interior de São Paulo. De acordo com os cientistas (e a Wikipedia), sou um Zillenial: tenho dupla cidadania em ambas as gerações e posso, ao mesmo tempo, apelar à nostalgia E pedirem pra eu consertar a conta do Instagram da minha tia. A pequena diferença aqui é que, enquanto a maioria da Geração Z começou suas vidas com um telefone celular, aprendi a digitar no teclado de um desktop antes de escrever no papel.

As pessoas sempre ficam tristes quando eu digo que nunca tive TV a cabo ou videogame na minha infância, mas tive o privilégio de ter acesso a computadores e internet desde que nasci. Sim, era um computador antigo com Windows 98 e internet discada que só dava para usar nos finais de semana, mas esta é a minha memória mais antiga que me lembro. Eu, ainda criança, sentado em uma cadeira alta, olhando para meu pai usando o PC.

Windows 98

De uma forma ou de outra, eu cresci com a Web. Quando eu era criança, ganhei meu primeiro endereço de e-mail, aprendi a criar conta em sites infantis. Todo fim de semana, quando eu conectava, a primeira coisa que era obrigado a fazer era baixar a atualização do Norton Antivirus pro meu pai. Adorava navegar em sites pra baixar software, porque eu queria experimentar novos jogos e aplicativos durante a semana. Foi também a primeira vez que tentei fazer design de páginas web: usei o GeoCities e o Microsoft FrontPage sem parar como se fosse o MS Paint.

Imagine uma época em que tudo na web eram sites estáticos e a única coisa que um usuário poderia mudar era um contador de visitas, um mundo onde a pasta Favoritos do navegador era um tesouro a ser repassado por gerações. Uma época em que o Celso Portiolli poderia tentar uma carreira musical e sua principal música poderia ser sobre amizades virtuais. Se eu fosse mais velho, provavelmente teria sido um usuário de IRC, mas a única coisa gravada em minha mente é o som de notificação do ICQ do meu pai.

(alguns sites antigos que eu tive durante os anos, de cima pra baixo, esquerda pra direita: (1) meu primeiro site no GeoCities, que fiz com meu pai em 2004; (2) minha mais séria tentativa em fazer um blog de humor em 2011; (3) o "rebranding" que eu fiz nesse mesmo site em 2012, com desenho de Mitsujii; (4) um agregador de links que eu chamei de portfólio em 2016 quando tentei ser um redator freelancer)

(alguns sites antigos que eu tive durante os anos, de cima pra baixo, esquerda pra direita: (1) meu primeiro site no GeoCities, que fiz com meu pai em 2004; (2) minha mais séria tentativa em fazer um blog de humor em 2011; (3) o "rebranding" que eu fiz nesse mesmo site em 2012, com desenho de Mitsujii; (4) um agregador de links que eu chamei de portfólio em 2016 quando tentei ser um redator freelancer)

O tempo passou, a internet começou a mudar e eu também. Quando comecei a entrar na adolescência, a Web 2.0 começou a realmente se tornar uma realidade. Eu lembro dos sites de compartilhamento de fotos ficarem famosos (como o Fotolog), e então as redes sociais começaram a aparecer. Os gringos tinham o MySpace, mas aqui na terrinha, a gente AMAVA o Orkut! Mesmo agora, para a maioria dos millennials, esse logotipo rosa é O símbolo da Web dos anos 2000.

Bem, e então, tudo aconteceu!? O Facebook começa a dominar tudo, o YouTube ganha muita força e torna o compartilhamento de vídeos uma verdadeira realidade, o Twitter simplesmente explode e se torna a nova sensação. Durante esse processo, o Orkut ainda era muito famoso, e pipocavam os muitos blogs de humor, apenas criando memes de primeira geração e repostando vídeos legais de outros blogs de humor. Tentei muito fazer parte disso, talvez com uma dezena de blogs diferentes e alguns canais no YouTube. Não, você não pode assistir meus vlogs de adolescentes ou vou ter que te matar.

Orkut

Olhando para trás, eu realmente vivi na internet todo esse tempo. Se foi saudável eu não sei, mas definitivamente vivi. A maioria dos meus hobbies na época era fazer algo no computador, provavelmente na web. Meu jogo favorito quando criança era Club Penguin, sabe? É estranho que as crianças de hoje em dia simplesmente nasçam com um smartphone nas mãos — e eu tive uma infância parecida, mas tão diferente. É por isso que encontrar o meu caminho na Internet não é apenas fazer um hobby ou criar uma nova conta em mais um app: a Web é parte integrante da minha história e a minha persona online é uma parte importante de mim.

Procurando minha identidade digital

Durante todo esse tempo, eu era apenas uma criança com acesso à internet fazendo coisas infantis. Experimentando coisas, copiando as tendências. Nunca tive sucesso ou fama, provavelmente porque estava literalmente copiando os blogs que lia ou os vlogs que assistia. Mas a partir de 2011-2012, comecei a escrever "de verdade" sobre jogos na Web, em sites muito maiores (e mais bem-sucedidos) do que qualquer coisa que eu pudesse fazer sozinho.

E, durante anos, nunca parei. Comecei a ganhar seguidores nas redes sociais só porque escrevia sobre jogos em um portal de médio porte e pronto. Foram, pelo menos, artigos originais! (Progresso!) Eu estava no ensino médio nesse período e a internet já era bem mais algorítmica e centralizada do que antes.

De repente, criar uma coisa sozinho virou uma ideia idiota, sabe? Por que me preocupar em começar do zero quando posso simplesmente escrever nos espaços de outras pessoas? Essa pouca visibilidade — que nunca tinha tido até então — foi suficiente para alimentar minha síndrome do impostor. Ninguém iria seguir um garoto estúpido como eu, eu já tive sorte de conseguir uma maneira de escrever e ser conhecido sobre isso.

E, ao mesmo tempo, estava entrando na faculdade pra estudar Ciência da Computação. Estou muito grato por minha universidade ser pública, mas eu precisava de algum dinheiro para conseguir comida e um lugar para morar em uma cidade maior. Escrever passou a ser também uma forma de ajudar meus pais a pagar as contas e tentar conseguir um diploma no final de tudo isso.

Em questão de anos, aquela criança que via a internet como um playground infinito se foi. Eu era apenas um ser humano recém-promovido à idade adulta, preocupado com dinheiro e entrando em uma espiral de baixa auto-estima e esgotamento. Eu ganhei alguns trocados fazendo copywriting para blogs corporativos e um portal de apps cheio de clickbait, mas era isso. Em alguns meses, comecei minha iniciação científica (que tinha uma boa bolsa de estudos), e depois consegui um emprego como desenvolvedor web.

E aí, acho que nunca mais entendi o que queria da internet. Além de gostar de ser um usuário “comum” (mas cronicamente online), claro. Para uma pessoa que criava projetos estúpidos mensalmente, era um pouco triste me ver assim. Eu sei que, bom, agora eu era adulto, com emprego, responsabilidades e cansaço mental, mas faltava alguma coisa. Faltava uma persona de internet que fizesse sentido de novo.

um dos meus muitos protótipos de jogo de tabuleiro que nunca consegui levar pra frente

(um dos meus muitos protótipos de jogo de tabuleiro que nunca consegui levar pra frente)

Continuei escrevendo para vários portais diferentes, ao lado de pessoas muito talentosas, mas nunca fiquei muito feliz com o que estava fazendo? Em apenas alguns meses, sempre se tornava um trabalho mecânico e sem alma que eu fazia de graça para alguém. Mesmo quando tentei ser "game designer" de verdade durante a pandemia, comecei quase uma jornada dupla de trabalho e a síndrome do impostor atacou na primeira recusa de uma editora.

Até mesmo esse nome de domínio, gabtoschi.com, já abrigou três ou quatro sites diferentes em apenas alguns anos. Eu acordava e decidia que um novo blog resolveria meu problema criativo. Em uma semana, encontrava um modelo no Google, modificava alguns estilos e encerrava o dia. Nunca atualizava ou escrevia nada até a próxima epifania. Ad infinitum.

Crescer com a internet me ensinou como era prejudicial transformar todos os seus sentimentos e opiniões em big data nas redes sociais. Simplesmente não consigo compartilhar tudo o que sou em tweets ou histórias, isso não faz sentido para mim. De alguma forma, preciso descobrir quem eu quero ser na internet, qual seria o lugar certo pra minha criatividade fluir. De certa forma, quero de volta a inocência, a coragem, a sinceridade e a confiança nas minhas próprias ideias, como quando eu era criança.

Meu novo cafofo digital

Neste ponto dessa minha reflexão, você já entendeu o que decidi que seria minha saída criativa. Este site, feito do zero, por mim (com uma grande ajuda da minha esposa). Chega de templates (para o site e para mim). Todo este texto não serve só apenas pra apresentá-lo a vocês, mas me lembrar por que isso ficou na minha cabeça por tantos meses.

Gosto da ideia de criar uma persona na internet, de verdade. Uma versão minha que me sinto confortável em tornar pública e preservada para sempre no Internet Archive (ou em um banco de dados russo). Sinto-me mais seguro porque minha vida e minha família estão preservadas e posso estar conectado com pessoas de todo o mundo a partir da minha casa. O Celso Portiolli nem tava tão errado nisso, se você pensar bem.

A primeira coisa que ficou bem clara para mim foi entender que internet é um hobby e não um trabalho. Já tenho um trabalho — que é criar páginas na internet, eu sei, nem começa. Fazer essas coisas precisa ser por diversão, para ser bobo, e não mais uma pressão para obter resultados, engajamento ou lucro. Já tenho muito capitalismo na cabeça todos os dias e não posso escolher (de novo) ter mais.

Mas por quê? Isso estava me afetando de verdade. Se não for para ser famoso ou ganhar dinheiro, por que criar um blog para escrever hoje em dia? Se eu quiser apenas tirar alguma coisa de mim, posso falar comigo mesmo no chuveiro.

Então percebi a única coisa que a Web nunca falhou comigo: unir pessoas. Tenho amigos com quem converso mensalmente (pelo menos) há uma DÉCADA. Alguns deles são tão próximos que eu convidaria para o meu casamento (e realmente convidei). Há algumas pessoas que conheci através de mensagens e videochamadas que estão mais próximas de mim do que a maioria das crianças que estudei juntas, todos os dias, durante 8 anos.

Então, vou criar um blog para falar sobre coisas que gosto e encontrar outras pessoas que também gostem dessas coisas. Eu adoraria ter alguém para falar, em detalhes, qual é o melhor minigame do Club Penguin, ou quão interessante é essa joia escondida do Nintendo DS lançada apenas no Japão. Ou ainda, algo que já fiz bastante em outros lugares, apenas falar de bons jogos e ajudar outras pessoas a encontrá-los! Esse é um belo objetivo e eu adoro isso.

Acho que escrever é uma boa maneira de divulgar ideias para mim, pessoalmente. Não apenas porque faço isso há 10 anos, e me sinto confortável em fazê-lo. Mas porque sou mestre em iniciar projetos, esfriar a animação e parar de vez com eles. Se eu puder, pelo menos, escrever sobre minha tentativa, talvez acabe sendo um tipo de satisfação pessoal maior do que só ver mais uma coisa abandonada na minha frente.

E também, é tão bom não estar preso à plataforma de uma grande empresa hoje em dia. Sim, provavelmente precisarei das redes sociais para encontrar essas pessoas, mas não preciso me preocupar se o YouTube excluirá meu canal quando eu estiver dormindo. Ou que uma rede social na qual eu poderia ter investido tempo e esforço seria comprada por um estúpido e começaria a desmoronar diante dos meus olhos. Meu conteúdo, meu espaço, meu controle.

É engraçado que, por tanto tempo, procurei uma maneira de descrever minha personalidade na internet. Um desenvolvedor web? Um escritor relacionado a jogos? Um designer de jogos? E então encontrei três palavras: curiosidade, criatividade e caos. Não importa exatamente o que estou fazendo: se sou curioso para aprender, criativo o suficiente para fazer algo e caótico o suficiente para me divertir, tá tudo bem.

Boas-vindas!

É isso. No final das contas, só preciso ser mais parecido comigo mesmo quando criança. Não há ideias estúpidas, não tem pressão. Sempre me diverti na internet, e farei isso de novo, mas como uma pessoa que viveu mais, aprendeu mais e sabe fazer mais. E se você gostou, eu adoraria me conectar com você, através de meus artigos, resenhas, projetos ou tweets idiotas.

Se você acabou de ler algo e quer comentar, fale! Você é um criador de conteúdo que deseja bater um papo e talvez fazer algo juntos? Vamos bater um papo! Você é um desenvolvedor/publisher/PR de jogos e acha que eu faria uma boa análise do seu jogo? Mande-me um email!

Sem pressão, só vibes. Parece que uma nova parte de mim está viva novamente, e estou muito animado para me divertir com este lugar estranho novamente. Me deseje sorte!

Obrigado a Super Snapper (no Unsplash) pela foto de capa.